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terça-feira, 5 de outubro de 2010

Pensamentos litúrgicos

Pensamentos litúrgicos

A Liturgia introduz-nos na atmosfera misteriosa da relação
sadomasoquista, é quando a submissa se esforça para que todo seu corpo
e alma proclame a sua devoção incondicional e disciplinada ao seu Sr.
A liturgia é um exercício que resulta na integração entre o Sr e a
sub. Na liturgia a relação é sincronizada pelo ritual do desejo, ou
seja, Sr e sub associam-se instintivamente é quando a sub reconhece,
nEle a sua voz, e Ele nela a sua voz.

A ação litúrgica torna-se mais encantadora e eficaz em seus objetivos
quando os ritos são feitos com convicção, mas de maneira leve, sem
deixar de serem solenes

A liturgia é ação disciplinadora por excelência. A liturgia realiza e
manifesta como sinal visível da relação entre o Sr e a sub através de
uma linguagem comportamental e ritualística. A liturgia tem de ser
precedida pela cumplicidade inteligente. É na liturgia que, por meio
de símbolos e gestos, que a sub diz ao seu Sr: “quero cumprir
inteiramente a vossa vontade. Eu quero vos agradecer".

A liturgia deve seguir um rito próprio de cada relação, mas sempre
procurando encontrar o ponto de equilíbrio entre o rigor formal
próprio que define a condição do Sr e da escrava sem perder o
requinte encantador da perspicácia fazendo aflorar os sentidos e as
emoções.

A liturgia deve trabalhar os sentidos, o olfato, o tato, o paladar, a
visão, a audição sem desprezar as sensações que em seu núcleo reclama
a dramaticidade dos acontecimentos e faz concretizar a sua cruel
realidade corporeidade a começar pelo ritual do comportamento, que é a
verdadeira morte das vontades da submissa. Os ritos comportamentais,
vira às avessas o visível para revelar o invisível e escava na alma
submissa para gerar a docilidade que encanta e possibilita a entrega
sacrificial fazendo emergir um sentido excessivo de um corpo
flagelado, suado, trespassado como agradável odor desejado por seu Sr.

Durante a relação litúrgica cada ato está cheio de significado. A
liturgia vive precisamente da ativação dos nossos sentidos, não
podendo sequer falar em ação ritual sem a participação na mesma. Esta
participação caracteriza-se principalmente pela variedade de códigos e
linguagens requeridos pelo rito que ajuda a criar o “ambiente”
litúrgico e liga-se à “memória” da inserção da nossa história
pessoal.

É pelo corpo e pela ação que o ser humano se liga ao espaço. Mas a
nossa “situação” não constitui um fenômeno totalmente externo, nem uma
experiência puramente interna da consciência. O ser humano habita
“espaços potenciais” aos quais acede por meio de “objetos
transacionais”. Esta experiência faz descobrir o “ambiente” e dele
depende largamente. Também a liturgia se dá num ambiente condicionado
e possibilitado pela implicação corporal no rito. Desta forma, o
espaço litúrgico não corresponde simplesmente ao lugar (segundo um
critério quantitativo), nem propriamente ao nosso “estar ali” (mesmo
que consciente e atentamente.), mas é delimitado por uma experiência
de mútua implicação e sujeição a condições ambientais, corporais e
intersubjectivas.

Elementos naturais como as roupas, os sapatos, a vara da disciplina, o
tom de voz … surgem como os “objetos transacionais” que permitem a
constituição da liturgia como espaço potencial, isso significa dizer
que a experiência que deles fazemos é que “situa” a liturgia. E esta é
uma experiência de ativação dos nossos sentidos. Do uso comum e
quotidiano destes elementos mantemos apenas um gesto estilizado,
subtraído a qualquer utilidade, de modo a revelar o sentido do porque
estamos vivendo o que vivemos. Com estes elementos, podemos
compreender a forma como o uso ritual do código dos sentidos se liga
ao ambiente. Basta pensarmos na vara da disciplina que imediatamente
se espalha um clima de castigo e envolve o espaço e as pessoas.
Particularmente sugestivo pode ser a articulação entre o código
visual, o código olfativo e o código espacial inerente ao uso das
velas, das flores ou qualquer outro objeto na liturgia.

Na relação litúrgica o importante são as sensações e estas só pela
ativação dos sentidos se pode atingir: na liturgia, não colhemos a
diferença (do significado), mas sim a identidade (do significante):
vemos a “ vara do castigo” e a submissa de joelhos, ouvimos o choro
da submissa sufocado quase contido na alma e oferecemos o colo da
penitencia,a sub olha para a coleira e caminha em direção ao altar da
entrega, a sub sente o toque das mãos do Sr em seu rosto ela responde
em atitude de adoração e assim sucessivamente.

Dom Resende

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